quinta-feira, 1 de julho de 2021

Sociologia no Brasil e a Identidade do Brasileiro

 Sociologia no Brasil e a Identidade do Brasileiro



 

Por uma Sociologia Brasileira

Havia uma emergência, uma necessidade de compreender sociologicamente o país e seu povo: o colonialismo, a escravidão e a miscigenação.

A primeira metade do século XX marca a institucionalização do campo das Ciências Sociais no Brasil.

A principal preocupação dos grandes teóricos brasileiros era descobrir o verdadeiro Brasil e os brasileiros. Era uma espécie de resposta em contraposição ao olhar “etnocêntrico” estrangeiro a respeito do Brasil. O estereótipo criado já não agradava tanto e o que importava no momento era a leitura do Brasil realizada por brasileiros – de dentro para fora.

Como não havia o curso por aqui, e ainda demandaria um tempo até que se formasse uma primeira geração de sociólogos, nossa primeira geração da Sociologia Brasileira foi composta por cronistas, jornalistas e literatos, autores que fizeram estudo com um caráter mais voltado à Literatura do que para a Sociologia de fato.

O reconhecimento como primeiro sociólogo de formação acadêmica diferente dos demais foi dado a Euclides da Cunha (1866-1909), 1º tenente, bacharel em Matemática, Ciências Físicas e Naturais. Renomado cronista, cobriu - como correspondente - a “Guerra de Canudos” (1896-1897) para o Jornal “O Estado de São Paulo”. Após a guerra, publicou “Os sertões”.

Além da guerra e suas especificidades, ele revela um verdadeiro retrato do Brasil no fim do século XIX, discutindo problemas que transcendem o conflito que ocorreu no interior da Bahia. A obra narrativa mistura literatura, sociologia, filosofia, história, geografia, geologia, antropologia, por isso sua preciosidade e grandiosidade. O autor, adepto do determinismo, teoria que afirma ser o homem influenciado (determinado) pelo meio, pela raça e pelo momento histórico, parece falar com muita propriedade sobre o sertão e o sertanejo, seu cotidiano, seu jeito de ser, seus costumes e suas crenças.

 

A Identidade Brasileira

A identidade brasileira foi decorrente de um processo de construção histórica, como em diversos outros países. Apesar de ter-se iniciado após a Independência, em 1822, o processo de constituição da identidade nacional ganhou um impulso maior após a década de 1930, quando Getúlio Vargas chegou ao poder. A partir disso, pôde-se perceber que a construção da identidade, para além de um processo cultural, era também um processo político.

A identidade nacional é construída, dialogicamente, a partir de uma autodescrição da cultura. Dois grandes princípios regem as culturas: o da exclusão e o da participação. Com base neles, elas autodescrevem-se como culturas da mistura ou da triagem. A cultura brasileira é considerada uma cultura da mistura.

Na história do Brasil, a ocorrência da mestiçagem é bastante pronunciada. Esse fato gerou uma identidade nacional singular e um povo marcadamente mestiço na aparência e na cultura.

Do século XVI ao século XVIII, em aproximadamente 15 gerações, consolidou-se a estrutura genética da população brasileira, com o entrecruzamento de africanos, portugueses e índios. Ainda no período colonial, franceses, holandeses e ingleses tentaram se estabelecer em território brasileiro e deixaram alguma contribuição étnica, embora restrita.

Sabe-se que foram os ingleses que inventaram o futebol tal como ele é jogado nos dias de hoje. Ainda assim, o país conhecido como o país do futebol é o Brasil. Pelo menos era assim alguns anos atrás. E agora? Após o 7 × 1 na Copa de 2014, as eliminações em competições sul-americanas e a ausência de jogadores brasileiros entre os vencedores do título Bola de Ouro, a posição do Brasil como o país do futebol está comprometida?

Seja qual for a resposta para essa questão, é interessante perceber como as pessoas consideram que determinados elementos fazem parte da identidade de um país. O Brasil é muitas vezes lembrado como o país do futebol, do carnaval, do café, da malandragem etc. Mas será que esses estereótipos realmente representam a identidade brasileira? Embora muitas pessoas não sejam malandras, não gostem de carnaval, não gostem de futebol e nem tomem mais café que em outras partes do mundo, associamos esses elementos ao Brasil. Será que isso faz sentido? Será que é tão simples desvendar a identidade do Brasil a partir desses elementos?

Uma outra característica que se apresenta em alguns filmes estrangeiros, quando bandidos tramitam suas fugas, é que o Brasil é um bom país para se esconder.

O passaporte brasileiro já foi um dos mais falsificados e é um dos mais cobiçados e mais valorizados no “mercado ilegal” atualmente. O Brasil é tão miscigenado que fica fácil ser brasileiro com características de várias nações. Não existe um estereótipo definido. Sendo assim, qualquer pessoa pode se passar por brasileiro muito facilmente, transformando este passaporte em um coringa para quem precisa usar de falsidade ideológica. Por isso, um alerta para um cuidado redobrado no exterior ou mesmo no Brasil: o passaporte deve estar bem guardado.

Mas... o que significa dizer “ser brasileiro”? Quem são, o que foram e o que querem ser? Qual é a característica do país que o singulariza perante outras nações? Qual é a identidade do Brasil, seu rosto, seu retrato? Essas são algumas das perguntas que compõem a reflexão sociológica a respeito do Brasil. Todavia, será que existe uma única resposta para essas questões? Evidente que não. A resposta vai depender bastante do sujeito específico que vai respondê-la. A avaliação sobre o que o Brasil é, foi e os prognósticos para o futuro dependerá também do presente histórico no qual essas avaliações foram feitas. Durante o período colonial, o país era retratado de algumas maneiras, no início do período republicano, de outras, nos dias atuais, de outras formas distintas. Existem, portanto, várias maneiras diferentes de representar o país.

No início dos anos 1940, Walt Disney, em visita ao Brasil, criou o desenho “Carioca da gema”, o Zé foi desenhado dentro do hotel Copacabana Palace. “'Joe Carioca' foi concebido em uma viagem de Disney e sua equipe à América do Sul durante a Segunda Guerra Mundial. O “famoso” Zé Carioca foi inspirado, basicamente, em três pessoas:

1) No cartunista J. Carlos – que colaborou nos primeiros rascunhos do personagem.

2) O estilo (fraque, chapéu e guarda-chuva) veio do doutor Jacarandá, famoso no Rio de Janeiro daquela época.

3) E, por incrível que pareça, o jeitão boêmio foi pego emprestado de um músico de São Paulo: José do Patrocínio de Oliveira, o Zezinho. Inclusive, o multi-instrumentista, que chegou a tocar com Pixinguinha, gravou a voz do papagaio carioca.

As três raças básicas formadoras da população brasileira são o negro, o europeu e o índio, em graus muito variáveis de mestiçagem e pureza. É difícil afirmar até que ponto cada elemento étnico era ou não previamente mestiçado.

Gilberto Freyre é considerado um dos mais importantes sociólogos do Brasil. A sua Pós-graduação nos USA deu origem à tese “A vida social no Brasil em meados do século 19”, que serviu de base para o livro “Casa Grande e Senzala” (1932). Com essa temática, autor discute de maneira original os sistemas econômico, social e político do Brasil Colonial a partir da contribuição do negro e do fenômeno da miscigenação na formação social do país.

 

O próprio Gilberto Freyre fala a respeito da constituição e da formação da identidade desse Brasil a partir de um encontro harmonioso entre as raças. A miscigenação teria sido positiva para compor a docilidade do “ser brasileiro”. Isso vai de encontro a teóricos sociólogos: Raimundo Nina Rodrigues (1862-1906) e Oliveira Vianna (1883-1957), que não só defendem o branqueamento da nação por meio da imigração europeia, como também o lado negativo da mistura entre as raças.

Sérgio Buarque de Holanda partiu de uma abordagem Weberiana para romper com o olhar “estereotipado” que os europeus desenvolviam sobre o Brasil.

Sua principal obra: “Raízes do Brasil” (1936) – parte da teoria weberiana de dominação legítima legal-racional para formular a ideia do “homem cordial” (característica do brasileiro: informal; criativo; flexível; “jeitinho”...).

Cordialidade não é gentileza! É uma propensão histórica à informalidade, em oposição à ética e à civilidade, que levou a criação de instituições coercitivas que diminuem o diálogo entre governantes e governados.

 

Florestan Fernandes dialogou com os principais pensadores brasileiros como Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda.

Ao contrário de Gilberto Freyre, que defendeu a inclusão do negro no Brasil através da miscigenação entre o índio, o branco e o negro, Fernandes se afastou dessa linha de pensamento.

Ao estudar a problemática do negro à luz do marxismo, Florestan Fernandes afirma que o mais prejudicado, no contexto da luta de classes, será o negro. Mesmo que o branco seja pobre e proletário, o negro vai sofrer o componente da discriminação racial.

Florestan entendeu a sociedade brasileira não somente como miscigenada, mas também como multiétnica.

Na história da formação do povo brasileiro – uma história de miscigenação, além daqueles que aqui já estavam, recebemos povos de Portugal, Holanda, África, muitos outros povos europeus e alguns asiáticos.

A união entre os diferentes biotipos humanos acabou gerando indivíduos que não eram completamente indígenas, brancos ou negros, no que se refere ao aspecto genético.

Por isso a mestiçagem é tão presente no país e é também por isso que podemos afirmar que não existe, na atualidade, nenhum grupo que seja racialmente puro.

Desta maneira, percebemos que o povo brasileiro se tornou uma grande mistura, tanto cultural e religiosa, como genética.

 

Preconceito, Discriminação, Segregação e Intolerâncias

 

Etimologicamente, pré (antes) + conceito, seria prejulgamento, significa julgamento prévio; refere-se a atitude de um indivíduo que emite juízo moral sobre determinado grupo social ou membro do grupo, antes mesmo de ter acesso a um conjunto mínimo de informações que o permita fazê-lo. Antecipa-se ao conhecimento e, às vezes, impede que esse aconteça.

O preconceito pode se manifestar de várias maneiras e pode ser mais ou menos explícito; pode envolver questões étnicas, religiosas, sexuais, entre outras. Perpassa por um conceito comum: REJEIÇÃO à pessoa ou ao grupo de pessoas que DIFEREM do observador. É considerado um fenômeno social, tendo como sua expressão-limite, o nazismo, que fundou uma identidade alemã (autoafirmação baseada na rejeição do diferente, do não alemão) e fundamentou uma política de extermínio, baseada no etnocentrismo (superioridade étnica).

Quando se fala de preconceito intersocietário ou intrassocietário, falamos de grupos ou classes dentro de uma sociedade que também são dotados de preconceitos contra outros grupos ou classes que compartilham o mesmo espaço social.

Preconceito: não é uma prática natural, mas uma postura aprendida, socialmente informada e difundida.

Oracy Nogueira (1917-1996) fala a respeito de preconceito racial de marca e preconceito racial de origem e faz a distinção entre o preconceito justificado pelo nascimento, como nos EUA, e o preconceito justificado pela cor, no caso do Brasil. O preconceito racial não é o mesmo em todos os lugares. Reduzido à questão da cor, o preconceito aqui é relativamente volátil. A cor pode ser diluída na mestiçagem, o que não ocorre nos EUA, pois lá é a origem racial, e não apenas a cor, que conta. Por isso, lá (EUA) o preconceito leva à exclusão; aqui leva a preterição.

O preconceito nas relações humanas acontece das mais variadas formas e pelos mais variados motivos: pode ter origem na cor da pele, na religião, no país ou cidade de origem, na aparência física, no gênero, na sexualidade etc. Qualquer forma de preconceito nas relações humanas é prejudicial para o desenvolvimento de uma sociedade justa, democrática e igualitária.

Apesar de socialmente ligados, os termos preconceito discriminação têm significados diferentes. Enquanto o preconceito é o pré-julgamento, a discriminação é o ato de diferenciar, de dar tratamento diferente. A discriminação é a ausência de igualdade ou a manifestação das preferências, causando cisões sociais entre os indivíduos.

Nesse sentido, a discriminação pode ser uma manifestação do preconceito. Entenda que nem sempre o preconceito é visivelmente discriminatório. Às vezes, as ações discriminatórias aparecem nas entrelinhas, com pouca visibilidade. Esse é o caso do racismo estrutural, que não é uma forma escancarada de racismo, mas causa pequenas ações discriminatórias contra pessoas negras no cotidiano e, muitas vezes, esse racismo é propagado inconscientemente por quem o pratica.

Separar, julgar e qualificar são ações comuns em nosso cotidiano, porém elas precisam ser delineadas com cuidado ao se tratar das relações sociais, para que não resultem em ações preconceituosas. É normal que separemos as pessoas que queremos mais próximas de nós por afinidade e afeto. No entanto, essa separação deve acontecer após o conhecimento da pessoa, e não por um motivo preconceituoso. No fim, a discriminação por preconceito é o golpe final que machuca as vítimas que sofrem de racismo, lgbtfobia, misoginia e outras mazelas sociais.

Já segregação é a ação de segregar, de separar, de isolar, afastamento, separação, marginalização. Em Sociologia, fala-se do isolamento forçado de um grupo para o afastar do grupo principal ou de outros, uma nítida demonstração de discriminação como acontece na segregação racial, por exemplo.

A segregação racial pode dar-se de maneira formal e informal, por meio de leis, repressão violenta ou de regras culturais de convivência.

 

África do Sul e o Apartheid

Se observarmos países em que ocorreu segregação institucional, como a África do Sul, veremos que, durante o apartheid, havia uma legislação discriminatória nas mais diversas áreas; remoções forçadas; detenções sem julgamento; repressão estatal à livre circulação por meio de leis de passe, pelas quais só seria possível ir a determinadas regiões portando autorização que deliberadamente não era concedida e proibições sociais e econômicas, como realizar casamentos inter-raciais, frequentar lugares públicos e candidatar-se a trabalhos industriais.

As formas culturais de segregação manifestam-se sem necessariamente valer-se de dispositivos legais ou repressão para que sejam cumpridas. Sua força reside em constranger indivíduos segregados a compreenderem sua exclusão como consequência de erros pessoais ou como um destino natural reservado a eles. Elas se somam a mecanismos institucionais que bloqueiam, por exemplo, a ascensão econômica, intelectual e política de determinados grupos étnicos.

Muitos homens e mulheres da comunidade negra sul-africana dedicaram suas vidas a esta grande causa: o fim do apartheid. Um dos mais notáveis líderes do movimento negro da África do Sul foi Nelson Mandela. Em 1944, junto com Walter Sisulo e Oliver Tambo, fundou a Liga Jovem do Congresso Nacional Africano (CNA), que se tornou o principal instrumento de representação política dos negros.

Em 1960, diversos líderes negros foram perseguidos, presos, torturados, assassinados ou condenados. Entre eles estava Mandela, que em 1964 foi condenado à prisão perpétua. Na década de 80, intensificou-se a condenação internacional ao apartheid culminando em um plebiscito, que terminou com a aprovação do fim do regime.

No dia 11 de fevereiro de 1990, depois de 26 anos, o presidente da África do Sul Frederik de Klerk, liberta Mandela. Ao sair da prisão, Mandela faz um discurso chamando o país para a reconciliação:

“Eu lutei contra a dominação branca e lutei contra a dominação negra. Eu tenho prezado pelo ideal de uma sociedade democrática e livre, na qual todas as pessoas possam viver juntas em harmonia e com iguais oportunidades. É um ideal pelo qual eu espero viver e que eu espero alcançar. Mas, caso seja necessário, é um ideal pelo qual eu estou pronto para morrer”.

Em 1993, Nelson Mandela e o presidente assinam uma nova Constituição sul-africana, pondo fim a mais de 300 anos de dominação política da minoria branca, preparando a África do Sul para um regime de democracia multirracial. Nesse mesmo ano, recebem o Prêmio Nobel da Paz, pela luta em busca dos direitos civis e humanos no país.

Após longas negociações, Mandela conseguiu a realização das eleições multirraciais em abril de 1994. Seu partido saiu vitorioso e Mandela foi eleito presidente da África do Sul. Finalmente, seu governo, com maioria no parlamento, acabou com o longo período de opressão aprovando importantes leis em favor dos negros.

Mandela governou até 1999, quando conseguiu eleger seu sucessor.

Em 2006, foi premiado pela Anistia Internacional, por sua luta em favor dos direitos humanos. Nelson Mandela faleceu em Joanesburgo, África do Sul, no dia 5 de dezembro de 2013.

 

USA e o “Jim Crow”

Nos Estados Unidos, índios foram dizimados a pretexto de uma colonização inglesa. O vasto território, teve desenvolvimento diferente nas regiões sul e norte. A escravidão praticada nos estados do sul (que objetivaram uma confederação separatista) foi abolida mediante guerra civil, a chamada Guerra de Secessão, entre 1861 e 1865. O Norte venceu a guerra, a escravidão foi imediatamente abolida, mas os brancos sulistas buscaram maneiras de segregar os negros recém-libertos.

Em 1865 foi fundada, por um ex-combatente das tropas sulistas, a “Ku Klux Klan”, grupo supremacista que praticava ações violentas contra negros. Embora reprimida pela polícia, essa seita ganhou milhares de adeptos.

Por ser um país com forte tradição federalista, cada estado norte-americano tem leis próprias. As primeiras leis segregacionistas após a abolição da escravatura foram promulgadas no Tennessee. Em 1870 esse estado proibiu o casamento inter-racial e em 1875 adotou um princípio legal denominando “separados, mas iguais”, que embasou dezenas de leis e foi adotado por outros estados sulistas.

O historiador Leandro Karnal ilustra a amplitude desse princípio que ficou conhecido como Lei Jim Crow – Segregação Racial Legal: “afastamento entre negros e brancos nos trens, estações ferroviárias, cais, hotéis, barbearias, restaurantes, teatros, entre outros. Em 1885, a maior parte das escolas sulistas também foram divididas em instituições para brancos e outras para negros”.

O episódio que impulsionou os movimentos contra a segregação ocorreu em Montgomery e foi protagonizado por Rosa Parks. Ela não aceitou ceder seu assento numa viagem de ônibus a um passageiro branco. Essa atitude desencadeou manifestações e um boicote de 382 dias ao transporte coletivo. Em 1956, um ano depois, a Suprema Corte norte-americana decidiu pela ilegalidade de segregação racial em locais públicos, uma vitória do movimento negro.

Havia o movimento de desobediência civil, cujo principal líder foi o pastor Martin Luther King Jr. Também havia o movimento adepto de luta armada, formado por negros muçulmanos e liderado por Malcolm X, chamado Panteras Negras. A ativista Angela Davis participou desse movimento.



O princípio “separados, mas iguais” só foi abolido pela Suprema Corte norte-americana nas décadas de 1950 e 1960. Em 1964 Martin Luther King Jr. foi premiado com o Nobel da Paz por sua luta pacifista contra o racismo. Também nesse ano foi promulgada a Lei de Direitos Civis, que baniu todas as formas de segregação racial. No ano seguinte, 1965, os negros sulistas conquistaram o direito ao voto.

 

A Realidade Brasileira

O Brasil foi o último país a abolir a escravidão, foi o país das Américas que mais recebeu africanos escravizados e, quando a abolição ocorreu, não foi acompanhada de indenizações e políticas públicas compensatórias que integrassem a população negra ao sistema econômico da população livre e assalariada. Portanto, como afirma o sociólogo Octavio Ianni, não foram cumpridas as premissas básicas para a passagem de escravo a cidadão.

cidadania abrange todos os direitos indispensáveis à vida do cidadão: a vida, a moradia, a saúde, a educação, uma renda etc.

O escravo “forro” foi abandonado à própria sorte e sua situação piorou na medida em que, além de ser substituído por mão de obra imigrante, foi destinado a trabalhos informais, subempregos, à vida nas periferias, sem qualquer acesso aos serviços públicos a que teria direito, continuando um trabalho duro e com baixas remunerações.

Ainda vivemos essa herança. Essa história não acabou lá atrás, mas foi “alimentada” e reproduzida até os dias atuais. O fruto dessa história é presente na realidade do mestiço brasileiro.

O grande intelectual Abdias do Nascimento assim definiu o racismo brasileiro:

“Não tão óbvio como o racismo dos Estados Unidos e nem legalizado qual o apartheid da África do Sul, mas eficazmente institucionalizado nos níveis oficiais de governo assim como difuso no tecido social, psicológico, econômico, político e cultural da sociedade do país”.




Multiculturalismo da Sociedade Brasileira

Multiculturalismo, ou pluralismo cultural, é um termo que descreve a existência de muitas culturas numa região, cidade ou país, com no mínimo uma predominante. O multiculturalismo, portanto, é a inter-relação de várias culturas em um mesmo ambiente, um fenômeno social que pode ser relacionado à globalização e às sociedades pós-modernas.

Alguns países apresentam maior multiculturalidade, devido aos diferentes grupos de imigrantes recebidos, mas também por observar outros fatores de integração e o desenvolvimento de novas culturas a partir do choque cultural. A ideia de um grupo multicultural então pressupõe que os grupos culturais estariam interligados, em função do contato que as culturas têm entre si.

O conceito de multiculturalismo tem grande influência do relativismo cultural, que questiona a ideia de que os hábitos e costumes de um grupo poderiam ser superiores a de outros. Essa ideia de que as culturas são diversas e devem ser respeitadas na sua essência, sem existir um certo ou errado nos costumes, é a base do multiculturalismo.

O Multiculturalismo no Brasil está diretamente associado ao processo migratório, desde a chegada dos portugueses em 1500. O Brasil se desenvolveu a partir de uma construção social entre os portugueses (europeus), os indígenas (povos originários) e os negros sequestrados e escravizados (de diversos territórios africanos). Ao longo dos séculos seguintes, o território brasileiro recebeu holandeses, franceses, espanhóis, italianos, japoneses, alemães e outros imigrantes, transformando a cultura brasileira.

Internacionalmente, o Brasil é conhecido por ser um dos países que melhor recebe seus visitantes, tentando adequar-se para receber bem as culturas alheias e com uma forte marca cultural própria. A diversidade étnica dos próprios brasileiros é outra forte característica multicultural. As diferentes cores de pele, os diversos costumes compartilhados, diferentes de credos religiosos, tudo isso faz parte do conjunto multicultural.

A coexistência de diversos grupos culturais em um mesmo lugar é um exemplo de multiculturalidade e representatividade. Como quando temos em uma mesma sala de aula alunos e alunas afro-descendentes, indígenas, caucasianos e asiáticos.

O respeito ao culto de diferentes religiões é um exemplo de multiculturalismo em nossa sociedade. Quando em um lugar convivam de forma amistosa membros do candomblé, fiéis de igrejas evangélicas, seguidores do catolicismo, ateus, budistas, entre outras crenças, pode-se dizer que se trata de um ambiente multicultural.

 

A música é um componente importante e presente em praticamente todas as culturas conhecidas. O reconhecimento de ritmos de outros grupos culturais, sem julgamento de quais seriam melhores ou piores, é outro exemplo de multiculturalismo.

Entretanto, essa multiculturalidade não pode ser confundida com o mito da democracia racial, que afirma que há uma perfeita igualdade étnica no país.

 

 

Políticas de Ação Afirmativa como formas de discriminação positiva

As ações afirmativas são políticas públicas que buscam minorar a desigualdade política, social e econômica entre grupos de uma sociedade. Este tipo de ação faz-se necessária quando a assimetria de oportunidades entre grupos sociais deriva de suas características culturais, fenotípicas, biológicas ou de injustiças históricas, comuns em sociedades que sofreram processos de colonização escravocrata, segregação racial, guerras civis. Ações afirmativas também são fundamentais em sociedades multiculturais ou com intensos fluxos migratórios.

A premissa básica das ações afirmativas é promover igualdade de acesso às oportunidades. As ações afirmativas propõem o tratamento desigual a não iguais para a construção de uma distribuição equitativa de bens e oportunidades. São importantes mecanismos para a ampliação da mobilidade social ascendente.

Elas permitem, ainda que de forma reduzida, que os caminhos percorridos por indivíduos de determinados grupos sejam frutos de sua escolha, não de suas circunstâncias. As ações afirmativas abarcam a promoção dos direitos civis, a emancipação material e a valorização do patrimônio cultural.

A Índia foi pioneira na implementação das políticas afirmativas, ao adotar como parte da legislação, em 1950, a criminalização da divisão de castas, que historicamente vinha dividindo a população indiana em grupos sociais hereditários (em que a condição social de um indivíduo passa de pai para filho). A estrutura de castas impedia a mobilidade social e, com isso, quem nascia nas castas mais baixas não tinha possibilidade de ascender socialmente, pois todos os mecanismos legais estavam reservados para as castas mais altas. O país passou a ter políticas de reserva para incluir “cotas de representação política nas legislaturas, cotas de contratação no serviço público e cotas nas instituições públicas de ensino superior”.

Nos EUA, as políticas de ações afirmativas foram implementadas na década de 1960, como resultado da luta por direitos civis e pela promoção da igualdade racial, voltada para o acesso nos espaços educacionais, políticos e econômicos. Foi nessa mesma década que se implementou cota no mercado de trabalho para impulsionar e garantir oportunidades para afro-americanos nos processos de contratação e seleção.

O início dos anos 2000 foi fundamental para a política nacional, porque foi no ano de 2001, durante a Conferência de Durban, que o Brasil reconheceu internacionalmente ser um país racista. A implementação de ações afirmativas ganhou força em 2003, com a lei 10.639, a qual estabelece o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na de Educação Básica.

Posteriormente, em 2012, houve a aprovação da Lei nº 12.711 para programas de cotas em universidades para pretos, pardos e pobres, como forma de diminuição das lacunas existentes e persistentes na formação de pessoas negras ao longo da história do país.

 

A Discriminação como um fator positivo

São medidas para favorecer os grupos que sofrem discriminação. Por esse motivo, alguns teóricos acreditam que a discriminação se torna um fator positivo. Não fosse esse indicativo, essas pessoas não seriam alcançadas por essas políticas afirmativas.

As políticas de ações afirmativas são medidas que possuem amparo na lei para implementação de uma discriminação positiva, ou seja, uma forma de estabelecer critérios para reconhecer as diferenças existentes entre os grupos sociais. Por meio de ações pontuais e por tempo determinado, as ações afirmativas têm como objetivo diminuir as desigualdades históricas vivenciadas por grupos sociais, como as populações negras e indígenas no Brasil.

Essas ações desempenham importante papel no combate à desigualdade social e às segregações. Elas permitem que pessoas de origens distintas alcancem espaços de influência no âmbito educacional, político, econômico, socioprofissional e cultural. Não se trata de concessão de benefícios ou privilégios a determinado grupo, mas da efetivação de direitos assegurados pela Constituição.

 

Os tipos de Ações Afirmativas

As ações afirmativas visam minorar as distorções impostas pela desigualdade. São empreendidas, principalmente, pelos governos, mas podem ocorrer também no ambiente empresarial, por iniciativa de grupos da sociedade civil organizada e mesmo por organizações multilaterais. Quanto ao modo de aplicação, também é variável, pode ser centralizado ou descentralizado, voluntário ou determinado por lei.

A dimensão socioeconômica, que abrange educação e renda, é a principal seara em que tais ações são desenvolvidas. São exemplos de ações afirmativas políticas sociais: bolsas, auxílios, reserva de vagas prioritárias em programas de habitação, reserva de vagas em creche, concessão de empréstimos, redistribuição de terras, cotas em diversos níveis de ensino e em concursos públicos, estímulo à contratação de indivíduos de grupos sociais discriminados, fundos de estímulo, preferência em contratos públicos, entre outros.

Além da dimensão material, oportunizada principalmente pelo acesso à educação, ao emprego, à habitação e aos meios de subsistência, as ações afirmativas englobam também a dimensão simbólica e cultural por meio de políticas de proteção a estilos de vida de povos tradicionais, como: povos indígenas, quilombolas, ciganos, ribeirinhos.

Também podemos destacar a questão das metas mínimas de participação nas mídias ou imprensa, em propagandas e comerciais, participação em novelas ou programas de TV em geral.

Recentemente, na política, uma nova lei estabeleceu um critério de participação de grupos minoritários, com verbas específicas para bancar essas candidaturas ou reservas de vagas em pleitos. Por exemplo, as ações afirmativas para ampliar a participação feminina na política existem desde a década de 1990, mas sem conseguir grandes resultados nas décadas seguintes. Assim, em 2018, o STF garantiu que 30% do fundo partidário seja destinado a candidaturas femininas.

 

As ações afirmativas no Brasil

A discriminação de minorias é fato recorrente ao longo da história. Não só na sociedade brasileira, como em todo o mundo. Como bem asseverou o Ministro Joaquim Barbosa:

“[…] a discriminação, como componente indissociável do relacionamento entre os seres humanos, reveste-se de uma roupagem competitiva. O que está em jogo aqui é, em certa medida, competição: é o espectro competitivo que germina em todas as sociedades. Quanto mais intensa a discriminação e mais poderosos os mecanismos inerciais que impedem o seu combate, mais ampla se mostra a clivagem entre o discriminador e o discriminado”.

No Brasil, as primeiras políticas públicas voltadas a não discriminação, se caracterizavam por medidas de cunho assistencialista contra a pobreza.

Posteriormente, a legislação passou a obrigar a inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, o que se pode considerar como a primeira efetiva ação governamental voltada para a inclusão de minorias. Apesar de essa inclusão ter sido possível em decorrência da promulgação da Carta Magna de 1988, essas mudanças somente ocorreram em decorrência da evolução da legislação internacional, como os tratados e as convenções, dos quais o Brasil era signatário. Com efeito, nos anos posteriores à promulgação da Constituição da República de 1988, as pessoas com deficiência obtiveram importantes conquistas, como o Dia Internacional das Pessoas Deficientes, proclamado pela Organização das Nações Unidas em 1981.

No campo educacional, as mudanças demoraram um pouco mais a ocorrer. No âmbito do Estado do Rio de Janeiro, houve a aprovação da lei estadual 3.524/00, de 28 de dezembro de 2000, que garante a reserva de 50% das vagas, nas universidades estaduais do Rio de Janeiro, para estudantes das redes públicas municipal e estadual de ensino. Esta lei passou a ser aplicada no vestibular de 2004 da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e na Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF). A Lei Estadual 3.708/01, de 9 de novembro de 2001, instituiu o sistema de cotas para estudantes denominados negros ou pardos, com percentual de 40% das vagas das universidades estaduais do Rio de Janeiro.

Segundo a referida lei, 20% das vagas são reservadas para estudantes de escolas públicas, 20% para negros e indígenas, e 5% para pessoas com deficiência e filhos de policiais civis, militares, bombeiros ou inspetores de segurança e administração penitenciária, mortos ou incapacitados em razão do serviço. Outro importante mecanismo no âmbito das ações afirmativas voltadas à educação se deu com o Plano de Metas para a Integração Social, Étnica e Racial, de 6 de junho de 2003, da Universidade de Brasília – UnB –, que instituiu o sistema de reserva de vinte por cento de vagas no processo de seleção para ingresso de estudantes, com base em critério étnico-racial. No âmbito Federal, o primeiro movimento se deu com a edição da Lei 10.588/2002, que instituiu o Programa Diversidade na Universidade. A Lei 10.588/2002 foi regulamentada pelo Decreto 4.876/2003 e pelo Decreto n.º 5193/2004. Após, foi promulgada a Lei no 11.096/2005, que instituiu o Programa Universidade para todos (PROUNI), que consiste na concessão de bolsas de estudos em universidades privadas a alunos que cursaram o ensino médio completo em escolas públicas ou particulares como bolsistas integrais, desde que a renda familiar fosse de pequena monta. O programa ainda atribui cotas das bolsas para negros, pardos, indígenas e pessoas com deficiência.

Por fim, pensou-se nas cotas para inclusão de alunos egressos de escolas públicas, através da edição da Lei 12.711/2012, que instituiu que 50% das vagas em universidades e institutos federais deverão ser reservadas a estudantes que frequentaram todo o ensino médio em escolas públicas.

Por isso, 45% das vagas da UERJ são destinadas a indivíduos nessas condições, desde que tenham baixa renda per capita.





Cidadania e Democracia

 

A origem da Cidadania

“A origem da palavra cidadania vem do latim civitas, que quer dizer cidade. Na Grécia antiga, considerava-se cidadão aquele nascido em terras gregas. Em Roma, a palavra cidadania era usada para indicar a situação política de uma pessoa e os direitos que essa pessoa tinha ou podia exercer”.

“A ideia de cidadania é muito antiga. Surgiu no século VIII A.C, na Grécia, uma sociedade em que os homens eram considerados livres e iguais, a chamada Polis – Grega. (...) todas as decisões que afetariam a comunidade eram discutidas, deliberadas e votadas. Nesse período a cidadania esteve longe de ser universal, apenas era considerado cidadão aquele que possuía riquezas materiais e propriedades de terra”.

 

A história do Conceito

Na idade média, com o feudalismo, a cidadania encontrou obstáculos, havendo inúmeros aspectos que inviabilizavam sua existência. O poder do feudalismo era administrado pela igreja católica e o exercício desse poder era hierárquico e inquestionável.

Sob essa estrutura não poderia existir cidadania, pois entre os gregos a cidadania era a igualdade entre os homens e o direito de discussão e deliberação para resolver os conflitos, enquanto no feudalismo o poder era dividido de forma arbitrária e os ditos da igreja eram incontestáveis.


O período entre o século XIV e XVI denominado Renascimento foi a época de transição do feudalismo para o capitalismo e foi marcado pelo ressurgimento da cidadania. Era considerado cidadão aquele que possuía o direito sobre as questões de cidade-estado. Tal direito não abrangia a todos, a cidadania era privilégio da elite dominante.

 

 

 

 

A Cidadania hoje

Aristóteles definiu o cidadão como todo aquele que tem o direito e consequentemente o dever de formar um governo. Hoje ser cidadão abrange muito mais que isso.

Ser cidadão é ter direitos e deveres e é ser reconhecido como um membro pleno e igual da sociedade. Já a cidadania é a conquista de tais direitos e o cumprimento dos deveres.

É através da cidadania que o indivíduo pode exercer seu papel fundamental no desenvolvimento da sociedade, lutando por melhores garantias individuais e coletivas e por direitos essenciais como: o direito à vida, à liberdade, à propriedade, e à igualdade.

Um fato marcante que elevou a cidadania ao que conhecemos hoje foi a Carta de Direitos da ONU (1948). Nela afirma-se que todos os homens são iguais perante a lei, independente de raça, credo e etnia. Confere-se o direito a um salário digno, à educação, à saúde, à habitação e ao lazer. Assegura-se o direito de livre expressão, de militar em partidos políticos, sindicatos, movimentos e organizações da sociedade civil.

 



Betinho

No que diz respeito aos deveres, a Carta estabelece que cabe aos homens fazer valer os direitos para todas as pessoas, ter responsabilidade pelo grupo social, respeitar e cumprir as normas e leis elaboradas e decididas coletivamente.

Segundo Betinho:

“Cidadania é, portanto, a condição da democracia. ...

O cidadão é o indivíduo que tem consciência de seus direitos e deveres e participa ativamente de todas as questões da sociedade.

Um cidadão com sentido ético forte e consciência de cidadania não abre mão desse poder de participação”.

Poder do Cidadão, 1995

 

 

 

 

 

 

Democracia

“A democracia é o governo do povo, pelo povo, para o povo.”

Abraham Lincoln (1809 – 1865), presidente dos Estados Unidos

 

“A capacidade do homem para a justiça faz a democracia possível, mas a inclinação do homem para a injustiça faz a democracia necessária.”

Reinhold Niebuhr (1892 – 1971), filósofo americano

 


Percebemos uma certa repetição no uso da palavra democracia nos discursos  políticos. Todos, sem exceção, qualificam seus projetos e suas práticas como democráticas. E a população – de forma hipócrita ou não – vota naqueles a quem consideram “mais democráticos”, mais “plurais”, mais “abertos” ao diálogo...

A origem da palavra também é grega; podendo ser etimologicamente dividida da seguinte maneira: demos (povo), kratos (poder).

A democracia grega era restrita e essa ideia começou a mudar a partir da Revolução Francesa e do Iluminismo moderno, que, por meio do republicanismo, passaram a advogar por uma participação política de todas as classes sociais. Ainda na Modernidade, apesar de avanços políticos e de uma ampliação do conceito de democracia, as mulheres não tinham acesso a qualquer tipo de participação democrática ativa nos países republicanos, fato que somente começou a ser revisto com a explosão do movimento feminista das sufragistas, que culminou na liberação, pela primeira vez na história, do voto feminino, na Nova Zelândia, em 1893.

Muitas pessoas explicariam que democracia é a presença de eleições. Mas também há eleições em ditaduras – como havia no Brasil durante o regime militar ou no Egito, em que o ditador ficou décadas sendo reeleito, e até mesmo em regimes totalitários como a Coreia do Norte, um dos mais fechados que o mundo já viu. As eleições ajudam a dar uma máscara democrática e de legitimidade a um regime autoritário, mesmo que não sejam eleições livres e nem competitivas.

Outros diriam que é quando a maioria decide no momento de alguma escolha – o que é verdade e importante, mas não define tudo. Outros ainda definiriam como o governo do povo – o que também não é uma definição holística.

Não existe uma resposta óbvia e direta: o conceito de democracia pode ser definido por diversos aspectos. Há ainda de se considerar que as democracias se apresentam em vários graus diferentes de desenvolvimento, desde aquelas com características autoritárias até as democracias mais desenvolvidas. E para complicar mais um pouco, a concepção de democracia mudou muito ao longo do tempo...

Apesar de conhecermos de perto a democracia, o conceito que designa a palavra é amplo e pode ser dividido e representado de diferentes maneiras. Não existindo apenas um tipo de regime político democrático, a democracia divide-se, basicamente, em: direta (Grécia Antiga), representativa (a nossa; atual) e a participativa (uma mescla das duas anteriores).

quinta-feira, 11 de março de 2021

Cidadania e Democracia

 

A origem da Cidadania

“A origem da palavra cidadania vem do latim civitas, que quer dizer cidade. Na Grécia antiga, considerava-se cidadão aquele nascido em terras gregas. Em Roma, a palavra cidadania era usada para indicar a situação política de uma pessoa e os direitos que essa pessoa tinha ou podia exercer”.

 


“A ideia de cidadania é muito antiga. Surgiu no século VIII A.C, na Grécia, uma sociedade em que os homens eram considerados livres e iguais, a chamada Polis – Grega. (...) todas as decisões que afetariam a comunidade eram discutidas, deliberadas e votadas. Nesse período a cidadania esteve longe de ser universal, apenas era considerado cidadão aquele que possuía riquezas materiais e propriedades de terra”.

 

A história do Conceito

Na idade média, com o feudalismo, a cidadania encontrou obstáculos, havendo inúmeros aspectos que inviabilizavam sua existência. O poder do feudalismo era administrado pela igreja católica e o exercício desse poder era hierárquico e inquestionável.


 

Sob essa estrutura não poderia existir cidadania, pois entre os gregos a cidadania era a igualdade entre os homens e o direito de discussão e deliberação para resolver os conflitos, enquanto no feudalismo o poder era dividido de forma arbitrária e os ditos da igreja eram incontestáveis.



O período entre o século XIV e XVI denominado Renascimento foi a época de transição do feudalismo para o capitalismo e foi marcado pelo ressurgimento da cidadania. Era considerado cidadão aquele que possuía o direito sobre as questões de cidade-estado. Tal direito não abrangia a todos, a cidadania era privilégio da elite dominante.

  

A Cidadania hoje

Aristóteles definiu o cidadão como todo aquele que tem o direito e consequentemente o dever de formar um governo. Hoje ser cidadão abrange muito mais que isso.

Ser cidadão é ter direitos e deveres e é ser reconhecido como um membro pleno e igual da sociedade. Já a cidadania é a conquista de tais direitos e o cumprimento dos deveres.

É através da cidadania que o indivíduo pode exercer seu papel fundamental no desenvolvimento da sociedade, lutando por melhores garantias individuais e coletivas e por direitos essenciais como: o direito à vida, à liberdade, à propriedade, e à igualdade.

Um fato marcante que elevou a cidadania ao que conhecemos hoje foi a Carta de Direitos da ONU (1948). Nela afirma-se que todos os homens são iguais perante a lei, independente de raça, credo e etnia. Confere-se o direito a um salário digno, à educação, à saúde, à habitação e ao lazer. Assegura-se o direito de livre expressão, de militar em partidos políticos, sindicatos, movimentos e organizações da sociedade civil.

 No que diz respeito aos deveres, a Carta estabelece que cabe aos homens fazer valer os direitos para todas as pessoas, ter responsabilidade pelo grupo social, respeitar e cumprir as normas e leis elaboradas e decididas coletivamente.

Betinho


Segundo Betinho:

“Cidadania é, portanto, a condição da democracia. ...

O cidadão é o indivíduo que tem consciência de seus direitos e deveres e participa ativamente de todas as questões da sociedade.

Um cidadão com sentido ético forte e consciência de cidadania não abre mão desse poder de participação”.

Poder do Cidadão, 1995

 

  Democracia

“A democracia é o governo do povo, pelo povo, para o povo.”

Abraham Lincoln (1809 – 1865), presidente dos Estados Unidos

 

“A capacidade do homem para a justiça faz a democracia possível, mas a inclinação do homem para a injustiça faz a democracia necessária.”

Reinhold Niebuhr (1892 – 1971), filósofo americano

 


Percebemos uma certa repetição no uso da palavra democracia nos discursos  políticos. Todos, sem exceção, qualificam seus projetos e suas práticas como democráticas. E a população – de forma hipócrita ou não – vota naqueles a quem consideram “mais democráticos”, mais “plurais”, mais “abertos” ao diálogo...

A origem da palavra também é grega; podendo ser etimologicamente dividida da seguinte maneira: demos (povo), kratos (poder).

A democracia grega era restrita e essa ideia começou a mudar a partir da Revolução Francesa e do Iluminismo moderno, que, por meio do republicanismo, passaram a advogar por uma participação política de todas as classes sociais. Ainda na Modernidade, apesar de avanços políticos e de uma ampliação do conceito de democracia, as mulheres não tinham acesso a qualquer tipo de participação democrática ativa nos países republicanos, fato que somente começou a ser revisto com a explosão do movimento feminista das sufragistas, que culminou na liberação, pela primeira vez na história, do voto feminino, na Nova Zelândia, em 1893.

Muitas pessoas explicariam que democracia é a presença de eleições. Mas também há eleições em ditaduras – como havia no Brasil durante o regime militar ou no Egito, em que o ditador ficou décadas sendo reeleito, e até mesmo em regimes totalitários como a Coreia do Norte, um dos mais fechados que o mundo já viu. As eleições ajudam a dar uma máscara democrática e de legitimidade a um regime autoritário, mesmo que não sejam eleições livres e nem competitivas.

Outros diriam que é quando a maioria decide no momento de alguma escolha – o que é verdade e importante, mas não define tudo. Outros ainda definiriam como o governo do povo – o que também não é uma definição holística.

Não existe uma resposta óbvia e direta: o conceito de democracia pode ser definido por diversos aspectos. Há ainda de se considerar que as democracias se apresentam em vários graus diferentes de desenvolvimento, desde aquelas com características autoritárias até as democracias mais desenvolvidas. E para complicar mais um pouco, a concepção de democracia mudou muito ao longo do tempo...

Apesar de conhecermos de perto a democracia, o conceito que designa a palavra é amplo e pode ser dividido e representado de diferentes maneiras. Não existindo apenas um tipo de regime político democrático, a democracia divide-se, basicamente, em: direta (Grécia Antiga), representativa (a nossa; atual) e a participativa (uma mescla das duas anteriores).

 

Fonte

Orientação de Estudos – SEEDUC RJ

 

quarta-feira, 10 de março de 2021

Senso Comum X Ciência

  

O senso comum é um tipo de pensamento que não foi testado, verificado ou metodicamente analisado. Geralmente, o conhecimento de senso comum está presente em nosso cotidiano e é passado de geração a geração. Podemos afirmar que este tipo de conhecimento é, categoricamente, popular e culturalmente aceito, o que não garante a sua validade ou invalidade.

O senso comum, por ser obtido a partir de um movimento de repetição cultural, pode estar correto ou não. Não é possível confiar neste tipo de conhecimento como se confia na ciência, mas também não podemos invalidá-lo de imediato, pois o fato de não se estabelecerem métodos e testes comprobatórios, não significa, necessariamente, que o tipo de conhecimento popular está errado.

O senso comum é movido, geralmente, pela opinião. É transmitido de geração a geração e consideramos um tipo de conhecimento sem qualquer base científica.

Você já deve ter ouvido muito a respeito de:

- Chá de boldo cura problemas no fígado. ...

- Ameixa e mamão ajudam a regular o intestino. ...

- Em time que está ganhando não se mexe. ...

- Há solução para tudo, menos para a morte. ...

- Brasileiro gosta de samba, churrasco e futebol.

Embora possamos considerar senso comum e ciência como dois tipos de conhecimentos opostos, porque inicialmente são muito diferentes, entretanto, existem algumas concepções e ideias que sugerem que, de certa forma, um completa o outro. De fato, a ciência é a fonte de conhecimento mais segura que temos, mas a validade do senso comum, em alguns casos, é notável. Se pensarmos que grandes pesquisas científicas que levaram a grandes descobertas farmacêuticas partiram do conhecimento de senso comum de plantas medicinais, por exemplo, temos um elemento para considerar o senso comum como um bom ponto de partida para impulsionar a ciência.

Um bom exemplo disso é o caso da utilização do boldo para resolver problemas digestivos, uma vez que, na sabedoria popular, apenas o senso comum admitia essa relação, porém, estudos farmacêuticos já comprovaram a eficácia do boldo para tratamento de indigestões e intoxicações, o que resultou no desenvolvimento de fármacos à base da planta.

Aristóteles definiu a ciência como um "conhecimento demonstrativo", ou seja, um tipo de conhecimento comprovado que pode ser expressado por meio de uma demonstração, com fundamento em observações, análises e experimentos considerando as mais diversas hipóteses sobre aquele assunto. Mas, se alguém perguntar a você "o que é ciência?", talvez seja difícil pensar em uma resposta correta, rápida e objetiva.

Especialistas determinam o século XVII – com a Revolução Metodológica e Científica proposta por Galileu (1564-1642) – como o mais importante para a ciência. Alguns pensadores costumam determinar uma época para o surgimento ou o nascimento da ciência, mas é fato que desde que o mundo existe, há ciência: alguém produziu o fogo, precisou produzir algum tipo de medicamento... desde sempre alguém quebra uma perna ou um braço, se corta, tem febre ou dor de cabeça...

A palavra "ciência" vem do latim "scientia", que significa "conhecimento". Por isso, é correto dizer que você "tomou ciência" quando tomou conhecimento de alguma coisa que aconteceu, de um fato.

No sentido mais específico da palavra, a ciência é aquele tipo de conhecimento que busca compreender verdades ou leis naturais para explicar o funcionamento das coisas e do universo em geral. É por isso que cientistas fazem observações, verificações, medições, análises e classificações, procurando entender os fatos e traduzi-los para uma linguagem estatística. E é aí que entra o método científico.

Se para tudo na vida precisamos de meta, na ciência não é diferente. Toda pesquisa tem uma meta – ou objetivo. E método, nada mais é do que o caminho que percorremos para alcançar a meta.

Em regra geral, o método científico segue algumas etapas básicas que são padronizadas para que o planejamento da pesquisa seja orientado. Podemos dizer que nem todas são obrigatórias, mas normalmente há uma ordem: observação, elaboração do problema, levantamento de hipóteses, experimentação, análise dos resultados e conclusão.

Vale ressaltar que quando falamos de ciência, estamos incorporando todas as ciências existentes, considerando as especificidades de cada uma delas. Por exemplo: nas Ciências Humanas, nem tudo pode ser reproduzido em laboratório.

 

A Sociologia como ciência

As Revoluções

A História do surgimento da Sociologia data do século XVIII, em decorrência da Revolução Industrial e da Revolução Francesa, que evidenciaram mudanças significativas na sociedade.

A Revolução Industrial foi um processo de grandes transformações econômico-sociais que começou na Inglaterra no século XVIII. Um processo que levou à substituição das ferramentas pelas máquinas, da energia humana pela energia motriz e do modo de produção doméstico (ou artesanal) pelo sistema fabril. Contribuiu para o fortalecimento e o enriquecimento da burguesia, mas trouxe consequências desastrosas à classe trabalhadora: os trabalhadores antes artesanais agora precisam trabalhar em fábricas, sem iluminação ou ventilação adequadas, com uma jornada de trabalho que chegava a 15h diárias, com o controle e a rigidez de um relógio e um gerente que monitorava o trabalho.

A Inglaterra foi precursora na Revolução Industrial devido a diversos fatores, entre eles: possuir uma rica burguesia, o fato de o país possuir a mais importante zona de livre comércio da Europa, o êxodo rural e a localização privilegiada junto ao mar, o que facilitava a exploração dos mercados ultramarinos.

Como muitos empresários ambicionavam lucrar mais, o operário era explorado sendo forçado a trabalhar até 15 horas por dia em troca de um salário baixo. Além disso, mulheres e crianças também eram obrigadas a trabalhar para sustentarem suas famílias.

Diante disso, alguns trabalhadores se revoltaram com as péssimas condições de trabalho oferecidas, e começaram a sabotar as máquinas, ficando conhecidos como “os quebradores de máquinas“. Outros movimentos também surgiram nessa época com o objetivo de defender o trabalhador.

O trabalhador em razão deste processo perdeu o conhecimento de toda a técnica de fabricação, passando a executar apenas uma etapa.

Devido à baixa remuneração, condições de trabalho e de vida sub-humanas, os operários se organizaram. Desta forma, associaram-se em organizações trabalhistas e sindicatos para reivindicar melhores e menores jornadas de trabalho e aumento de salários.

A mecanização se estendeu do setor têxtil para a metalurgia, transportes, agricultura, pecuária e todos os outros setores da economia, inclusive o cultural.

A Revolução Industrial estabeleceu a definitiva supremacia burguesa na ordem econômica. Ao mesmo tempo acelerou o êxodo rural, o crescimento urbano e a formação da classe operária. Era o início de uma nova época, onde a política, a ideologia e a cultura gravitavam em dois polos: a burguesia industrial e financeira e o proletariado.

As fábricas empregavam grande número de trabalhadores. Todas essas inovações influenciaram a aceleração do contato entre culturas e a própria reorganização do espaço e do capitalismo.

Nessa fase, o Estado passou a participar cada vez mais da economia, regulando crises econômicas e o mercado e criando uma infraestrutura em setores que exigiam muitos investimentos.

A Revolução Francesa é o nome dado ao ciclo revolucionário que aconteceu na França entre 1789 e 1799 que marcou o fim do absolutismo naquele país. Essa revolução, além de seu caráter burguês, teve uma grande participação popular e atingiu um alto grau de radicalismo, uma vez que a situação do povo francês era precária em virtude da crise que o país enfrentava.

O fato mais significativo é a tomada da prisão da Bastilha, em 14 de julho de 1789. Um mês depois, os franceses promulgaram a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.

Neste documento foi consagrado o princípio de igualdade de todas as pessoas perante a lei.

Esta revolução foi um marco na história da humanidade porque inaugurou um processo que levou à universalização dos direitos sociais e das liberdades individuais a partir da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, entre outras conquistas.

No final do século XVIII, a França era um país agrário, com a produção estruturada no modelo feudal. Devido às guerras na América e às más colheitas, a França atravessava uma crise econômica e política e para resolvê-la, os ministros do rei Luís XVI sugeriram que a nobreza e o clero deviam pagar impostos.

Por outro lado, para a burguesia e parte da nobreza, era preciso acabar com o poder absoluto do rei Luís XVI.

 

Fonte

Orientação de Estudos – SEEDUC RJ

 

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